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Arquivo Diário 29 de janeiro de 2018

Carta aberta Abrasco sobre a Febre Amarela no Brasil

Exatamente há um ano a Associação Brasileira de Saúde Coletiva divulgou a Carta aberta Abrasco sobre a Febre Amarela no Brasil  assinada por mais seis instituições do Movimento da Reforma Sanitária Brasileira onde apelava para que o Ministério da Saúde, dentro de seu papel constitucional, organizasse e coordenasse o combate à Febre Amarela, mobilizando e integrando ações dos estados, municípios, centros de pesquisa, universidades e meios de comunicação. 12 meses depois, a Abrasco dirigi-se novamente às autoridades sanitárias do Ministério da Saúde, das Secretarias Estaduais e Municipais de saúde e à sociedade brasileira para fazer o alerta: a ameaça da urbanização da Febre Amarela nos obriga a definir políticas de curto e médio prazo para prevenir futuros surtos. Leia a carta na íntegra:

O aumento do número de casos e de mortes por Febre Amarela registrado nas últimas semanas em Minas Gerais, Espírito Santo, Bahia, São Paulo e Distrito Federal está preocupando e causando insegurança na sociedade devido à gravidade desta doença e do risco de sua urbanização.

Sabe-se que uma extensa epizootia, epidemia em macacos suscetíveis a doença, vem acontecendo, simultaneamente, em vários estados brasileiros, em áreas próximas a cidades densamente populosas. Os atuais surtos de Febre Amarela têm sido atribuídos a pessoas picadas por mosquitos que vivem em áreas de mata, a Febre Amarela silvestre.

A Febre Amarela é uma doença imunoprevenível, ou seja, pode ser evitada desde que se adote medidas de prevenção adequadas, o que inclui elevadas coberturas vacinais e informações e ações de educação em saúde para que as pessoas não adentrem as matas ou permaneçam nas áreas consideradas de risco sem estarem imunizadas.

Estas ações, que devem ser contínuas e intensificadas quando se detecta epizootias, evitariam a crise pela qual estamos passando com dezenas de mortes até o momento. Em área urbana, a Febre Amarela é transmitida pelo mosquito Aedes aegypti, que tanto dano causa aos brasileiros, ao transmitir a Zika, a Dengue e o Chikungunya. As dificuldades de controlar este vetor são conhecidas. No ritmo em que vem aumentando o número de casos de Febre Amarela silvestre em humanos, torna-se assustadora a possibilidade de haver uma epidemia urbana da doença, na medida em que mais de 90% das cidades do país encontram-se infestadas por este vetor. Caso haja transmissão pelo Aedes aegypti em áreas urbanas, além das mortes que fatalmente ocorreriam até se detectar o problema e realizar um amplo bloqueio vacinal, o real controle da situação exigiria um enorme esforço e imenso quantitativo de vacinas para se proteger as populações residentes nas áreas urbanas infestadas.

Atualmente, o controle da doença depende primariamente da imunização da população de risco, a qual, neste momento, vem se estendendo rapidamente para mais municípios. Consideramos que não se pode mais afirmar com segurança que ainda não existe transmissão urbana da doença.

Preocupadas com a gravidade do atual surto de Febre Amarela silvestre em diversos estados brasileiros, as entidades integrantes do Fórum da Reforma Sanitária Brasileira abaixo assinadas reconhecem a necessidade de unir esforços para contê-lo o mais rapidamente possível.

A ameaça da urbanização da Febre Amarela nos obriga a definir políticas de curto e médio prazo para prevenir futuros surtos.

Prioritariamente, faz-se necessária a vacinação seletiva, imediata e abrangente das populações residentes ou que visitam as áreas onde estão ocorrendo casos de Febre Amarela. Isto somente será possível com um reforço da produção e da distribuição de vacinas, bem como da rede de frio. Ademais, deve-se considerar a importância de ampliar o quantitativo de recursos humanos treinados para indicar com segurança (vacinação seletiva) e aplicar o imunógeno em cada posto de vacinação. A disponibilidade de vacinas e a capacidade atual de realizar rapidamente estas ações estão aquém das necessidades das secretarias de saúde dos municípios afetados.

É urgente que o Ministério da Saúde atualize a lista de todos os municípios considerados de risco à luz do novo momento, tanto para planejar a ampliação e o fortalecimento destas medidas de vacinação para bloquear a ocorrência de casos e, consequentemente, impedir o avanço dos surtos, como para orientar a população que se desloca, por trabalho ou lazer, para estas localidades.

Cabe também ao Ministério da Saúde tornar pública a disponibilidade de vacinas e os planos de contingência para aumentar nossa capacidade de produção, distribuição e aplicação de vacinas.

É imperativo que protocolos de atenção clínica aos casos suspeitos sejam prontamente disponibilizados aos profissionais de saúde da rede do Sistema Único de Saúde (SUS) e que sistemas de alerta precoce sejam adotados pelos serviços de vigilância em saúde. É também necessário que se fortaleça a rede de laboratórios para que os diagnósticos dos casos suspeitos sejam realizados oportunamente.

Estas ações devem ser seguidas de uma análise criteriosa da cobertura vacinal atual e de uma política agressiva de imunização de toda a população em áreas de risco. Desta forma será possível reduzir o risco de uma epidemia urbana de Febre Amarela e deter a sucessão de mortes evitáveis.

Como política de longo prazo, urge reforçar a capacidade de produção de vacinas mais seguras, ou seja, menos reatogênicas à Febre Amarela.

Urge vigiar, investigar e adotar todos os meios para que não ocorra transmissão urbana da Febre Amarela no Brasil. Vale enfatizar que o combate à Febre Amarela, além de todas as medicas citadas, depende do investimento em saneamento básico e na preservação do meio ambiente.

Apelamos para que o Ministério da Saúde, dentro de seu papel constitucional, organize e coordene o combate à Febre Amarela, mobilizando e integrando ações dos estados, municípios, centros de pesquisa, universidades e meios de comunicação.

Rio de Janeiro, 29 de janeiro de 2018

Associação Brasileira de Saúde Coletiva

 

Publicado no site da ABRASCOhttps://www.abrasco.org.br/site/

Promoção da alimentação saudável na infância: fragilidades no contexto da APS

O Brasil passou nos últimos 30 anos por sucessivas mudanças socioeconômicas, de urbanização, de atenção médica e na saúde da população, processo que produziu impactos na saúde infantil, ainda que de forma desigual econômica e geograficamente.

Iniciativas como a Política Nacional de Alimentação e Nutrição, a Rede Amamenta Brasil, a Estratégia Nacional para Alimentação Complementar Saudável (ENPACS) e a Estratégia Amamenta e Alimenta Brasil ajudaram a reposicionar a questão a questão alimentar e nutricional na agenda das políticas públicas do setor de saúde. Entretanto, a implementação dessas políticas tem mostrado importantes limitações, especialmente pela descontinuidade de suas gestões e pela subnotificações de dados nos sistemas de informação.

Buscando exatamente identificar tais fragilidades que Ariadne Einloft, Rosângela Cotta e Raquel Araújo, da Universidade Federal de Viçosa, publicaram recente artigo na revista Ciência & Saúde Coletiva no início do ano. O artigo apresenta pesquisa qualitativa sobre o processo de implementação de programas da alimentação saudável na infância, na perspectiva dos profissionais capacitados em estratégias de alimentação infantil e vinculados à APS de Viçosa, município de Minas Gerais. No total, foram realizados questionários semi-estruturados com 79 agentes comunitários de saúde e grupos focais com 15 enfermeiros e um ACS de cada unidade do município.

Um achado inicial da pesquisa foi a fragilidade dos vínculos empregatícios no município, com a quase totalidade dos profissionais vinculados à administração local estarem sob regime de contrato temporário. Em relação às atividades relacionadas à saúde infantil, 78% dos ACSs relataram acompanhamento de rotina em crianças com menos de 2 anos, mas 36% afirmou que não havia uma definição clara de periodicidade.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

No que tange à avaliação qualitativa das ações desenvolvidas, as autoras elencaram quatro dimensões de análise:

  1. a profissional, trazendo à tona os depoimentos que revelavam a falta de educação continuada, o perfil inadequado dos profissionais vinculados à APS e a dificuldade de vinculação profissional num contexto de rotatividade;
  2. a organizacional, pontuando a sobrecarga e dificuldade na divisão do trabalho, a estrutura física precária, o excesso de exigências burocráticas, insegurança jurídica nos contratos de trabalho e o baixo envolvimento profissional;
  3. a qualidade técnica, em relação ao tipo, periodicidade, qualidade e continuidade das intervenções;
  4. e o microentorno, relacionando temas amplos como o perfil epidemiológico da população infantil, os desvios nutricionais, os determinantes sociais, o entorno materno e os modelos de atenção à saúde.

 

As autoras concluem o trabalho afirmando que estudos que incluam perspectiva dos participantes podem se configurar em um importante instrumento de participação e responsabilização social. Além disso, o cenário de desafios e fragilidades da construção do SUS depende de ferramentas de avaliação da operacionalização e qualidade, buscando minimizar efeitos de políticas e ações verticalizadas e descontínuas, auxiliando na geração de informações oportunas e adequadas ao entendimento dos diferentes contextos locais e experiências de atores sociais.

Boa leitura!